A história de como resolvi dedicar-me à fertilidade natural

Algumas pessoas têm-me perguntado o que é que me motivou para seguir o caminho da fertilidade natural.

Podia inventar uma história bonita e dizer que acordei um dia “iluminada” pela ideia, mas a verdade não é bem assim…

Após o nascimento da minha terceira filha, em 2007, decidi que não queria voltar a recorrer à contracepção hormonal. A decisão, tomada a dois, deveu-se ao facto de ambos considerarmos que o preço a pagar (dores de cabeça extremamente fortes) era demasiado elevado comparativamente aos benefícios.
Sabendo que os meus ciclos eram mais ou menos regulares, tentámos gerir a nossa fertilidade de uma forma empírica, baseando-nos nos sinais de fertilidade que o meu corpo me indicava mas, na verdade, sem aplicar um método específico.

Três anos mais tarde, porém, o (in)esperado aconteceu e engravidei novamente.

Mas as surpresas não tinham acabado. Afinal, não iríamos ter mais um bebé, mas sim dois: os nossos 4º e 5º filhos.

A gravidez foi considerada de risco. Apesar de todas as minhas tentativas de não ser tratada como uma bomba relógio prestes a explodir, com o rótulo de “mulher de 35 anos grávida de gémeos monozigóticos” estampado na testa, não posso dizer que tenha sido “um passeio no parque”.

Festejámos as 24 semanas com um grande alívio, pois, segundo nos disseram, a probabilidade de haver transfusão feto-fetal entre os gémeos diminuía consideravelmente a partir daí.

Uma semana mais tarde, porém, o coração do bebé T. deixou de bater, em plena ecografia, perante o nosso olhar incrédulo.

Foi-nos dito então, que o outro gémeo, o P., corria sério risco de vida e que, se sobrevivesse, poderia vir a ter limitações do foro mental, como paralisia cerebral.

As semanas que se seguiram foram angustiantes e o P. acabou por nascer às 31 semanas, após uma cesariana de emergência, com 1290 gramas.

Quando acordei da anestesia, vejo alguém a entregar-me um papel amarelo para assinar. Era uma declaração de óbito. Perante o meu olhar confuso explicaram-se que o bebé sobrevivente já tinha sido levado para os cuidados intensivos, mas que deveria pensar no funeral do outro bebé. O choque foi grande. Não estava à espera deste desfecho. Pensei sempre que o T. iria “nascer” sob uma forma etérea e não como um bebé do qual a lei nos obriga a despedir segundo um ritual para o qual não estávamos preparados (e quem está, afinal?).

Por sua vez, o P. continuava internado nos cuidados intensivos, monitorizado 24 horas por dia.

Após 2 longos meses, com muitos sustos pelo caminho, o P. teve alta. Entre inúmeras bradicardias, apneias, uma hemorragia cerebral e outras tantas peripécias que fizeram de nós experts em manobras de reanimação, o nosso bebé superou a prova com distinção e estava em casa.

Quando, finalmente, pude respirar um pouco melhor, dei por mim a regressar ao mesmo dilema de há uns anos atrás.

De todo o lado ouvia os mesmos “conselhos”: que deveria tomar a pílula imediatamente, que a probabilidade de engravidar novamente de gémeos era elevada, que se engravidasse de novo iria ter muito provavelmente bebés prematuros, que estes iriam ter problemas de saúde diversos, que… que… que…

Eu só tinha vontade de gritar. O corpo era meu e eu estava zangada com ele. Sentia-me deprimida, exausta, assustada e a última coisa que precisava era de uma injecção diária de medo. Mas eu tinha medo. Muito medo.

Consultei diversos médicos e a resposta foi unânime: teria que voltar à contracepção hormonal. Experimentei diversas pílulas e até o anel vaginal, mas sentia-me cada vez pior. Cada vez mais angustiada, deprimida e com a sensação de estar num beco sem saída.

Numa consulta hospitalar, meses depois, quando o meu desânimo estava a atingir um nível record, falaram-me uma “solução” inovadora, indolor e isenta de químicos. A única explicação foi-me dada de forma rápida: iria colocar uma espécie de molas nas trompas, que bloqueavam a passagem dos espermatozóides.

Eu não me lembro de muito mais, confesso. As minhas memórias dessa época são ainda muito vagas pois o estado depressivo em que me encontrava falava mais alto.

Lembro-me de estar no ambulatório e de ter permitido que interviessem no meu corpo, mas tenho a ideia de não ter compreendido na íntegra o que estava a acontecer. Estava tão zangada com o meu corpo, que na altura não queria saber de nada. Mais nada.

Meses mais tarde soube que as “molinhas inofensivas” que coloquei a bloquear as trompas têm sido alvo de controvérsia (e de muitos processos judiciais) pelo mundo fora. Comecei a frequentar fóruns de vários países e pude constatar a diversidade de relatos de mulheres que sofrem com dores constantes, testemunhos em que o útero ou as trompas foram perfurados, de um número surpreendente de gravidezes (tendo a maioria terminando da pior forma…), do desenvolvimento de doenças auto-imunes e alergias graves devido à rejeição do material pelo corpo e algumas notícias de mulheres que, infelizmente, tinham perdido a vida…

Então percebi que, na prática, continuava a ser fértil, mas que, se engravidasse, o desfecho poderia ser pior do que a situação que tinha vivido anteriormente.

Afinal não tinha voltado à casa de partida. Tinha conseguido recuar ainda mais…

Nesse momento de angústia e revolta, decidi pedir perdão ao meu corpo por ter duvidado das suas capacidades.
Pedi perdão por todos os gestos de desamor a que o sujeitei durante anos, quer sob a forma de químicos, quer com a imposição desta barreira física.

Alguns anos passaram e, quando olho para trás, sinto que saí de um filme estranho. Tenho ainda as cicatrizes e o amargo de boca por ter tomado uma decisão irreversível.

Mas fiz as pazes comigo e prometi a mim mesma que tudo faria para que cada vez mais mulheres possam ter acesso a informação que lhes permita tomar decisões informadas e conscientes relativamente à sua fertilidade.

Com gratidão,

Bárbara

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2 respostas

  1. Que honra ler a tua história, grande história! Grata por partilhares ♡
    Abraço e continua a ajudar mais mulheres a tomarem decisões informadas e conscientes. Beijinho

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